sexta-feira, 26 de junho de 2015

Conversa com Prof.César Fernando, Seia FC sobre futebol feminino

Fomos conversar com o Prof.César Fernando, do Seia FC, que nos falou da presença da turma senense nos Nacionais de Promoção e Taça Nacional de Futebol Feminino.


Magazine serrano--Seia recebeu recentemente a fase zonal da Taça Nacional de Futebol feminino, um grande feito?
foto:Face CF
Prof César--Sim, principalmente considerando que outros candidatos surgiram para a organização deste evento. A qualidade da infraestrutura municipal a par do reconhecimento da competência dos recursos humanos, fez com que a Federação Portuguesa de Futebol tomasse a decisão de o realizar em Seia. O nosso orgulho vai para além dessa escolha, congratulamo-nos pelo reconhecimento unânime da qualidade do serviço prestado.


MS- A turma do Seia ficou pelo caminho mas foi positivo participar?
CF- Naturalmente que sim. Sabíamos à partida que este grupo, considerado o mais competitivo, dificultava a nossa participação. No entanto, nunca deixámos de acreditar no nosso valor, no nosso trabalho. O facto é que existe uma diferença grande em termos competitivos, entre equipas que fazem um campeonato ao longo da época e nós, que a nível distrital, infelizmente não temos qualquer tipo de competição neste escalão. Com certeza que saímos desta competição, mais fortes e honramos o nosso compromisso, mas fica um amargo de boca por não podermos ter acesso a competição durante toda a época, capacitando as nossas atletas para enfrentar as adversárias desta competição. O sucesso da nossa prestação e organização foi reconhecido pelo Clube Albergaria, atual detentor do título nacional e vencedor desta fase, que nos honrou com um convite para participação no seu Torneio a realizar nos dias 27 e 28 deste mês.

MS-O Seia FC tem feito um excelente trabalho quer na formação, quer no futebol feminino?
CF-Isso é uma questão ou a simples constatação de um facto evidente?
Sendo uma realidade tão óbvia, permita-me apenas associar ambas. Isto é, no Seia Futebol Clube não separamos géneros, trabalhamos na formação independentemente de ser masculino ou feminino. Nesta casa não subestimamos género ou escalão etário, o lema é o mesmo para todos os escalões ou secções, queremos contribuir para a formação integral de todos os nossos atletas, incluindo nestes as pessoas que praticam Zumba no clube. O nosso contributo tem que ter as vertentes: académica, desportiva e social. Somos um todo e não apenas uma soma de várias parcelas, somos todos orgulhosamente senenses.  
MS - Com a dita crise financeira, o Seia FC ainda tem muitos apoios?
CF- A crise financeira já é quase secular no associativismo desportivo.
Quando criámos este clube tínhamos consciência de que o tempo dos “carolas” já tinha acabado. Também o tempo das câmaras subsidiarem os ordenados dos atletas acabou, ou tende a acabar, pois ainda existem casos caricatos onde se toma banho num balneário imundo, com 3 chuveiros em que dois não funcionam e o outro só deita água fria… Mas treinadores e atletas são bem pagos para vencerem as suas competições. Esta é a realidade ingrata do nosso futebol. Mas cada município, cada clube terá que tomar as suas opções.
No clube que represento apostamos no valor humano, nas convicções de quem tiver a capacidade de ser altruísta.
Felizmente, aos poucos, com muitas decepções pelo caminho, fomos encontrando pessoas com este perfil, pessoas integras e capazes de valorizar este clube, com ou sem crise financeira. Quem faz o clube são as pessoas e não apenas o dinheiro. Vivemos no limiar financeiro, tivemos mesmo que acabar com o escalão sénior e júnior masculino, mas isso não nos impediu de manter a nossa identidade.
MS- No que toca ao futebol feminino, o Seia FC pode vir a ser no futuro um viveiro de jogadoras também?
CF- Não acredito em viveiros per si só. Tenho a certeza de que a maioria das atletas só pratica futebol, porque nós existimos. Tivemos a coragem de não deixar o futebol feminino terminar no nosso distrito. Temos atletas da Guarda, Fornos e Manteigas, com todas as despesas inerentes ao facto, mas também com todo o esforço enorme que as mesmas fazem para poderem treinar e jogar. Estamos a incentivar outros clubes, as próprias escolas, fazemos um trabalho de fundo, não começamos a casa pelo telhado.
Percebo a sua questão, mas quando criamos plantas num viveiro, queremo-las ver mais tarde crescer em jardins bonitos. Neste momento esse jardim é o nosso!
Nós temos esta convicção, as atletas também a têm e só assim seremos mais fortes. Só imbuídos neste espírito orgulhosamente senense é que poderemos crescer.
Aceitamos que outros trabalhem de forma diferente, nem sequer ousamos dizer que é pior ou melhor, apenas estamos convictos de que o caminho para o sucesso se constrói e não se compra. É verdade que dá muito mais trabalho, é verdade que demora mais tempo, mas também é verdade que o sucesso alcançado é muito mais consistente. E é isso que procuramos.


MS- Como vê o futebol feminino e o desempenho da nossa seleção no distrito da Guarda?
CF- Infelizmente não posso ver de maneira diferente da sua ou de qualquer outra pessoa. Os factos falam por si…
Tal como referi relativamente ao Seia Futebol Clube, são os recursos humanos que fazem a diferença.
É gritante a ineficácia ou inexistência de trabalho em prol do desenvolvimento do futebol feminino. Não lhe chamarei negligência porque negligentes são aqueles que têm capacidade para o fazer e não o fazem…
Curiosamente isto acontece num distrito que já teve a honra de obter um título nacional ao nível de selecções, num distrito com várias jogadoras internacionais… Enfim, se este sucesso se reportasse á modalidade de futsal, calculo que a coisa seria diferente. Repito que são as pessoas que fazem a diferença, é na qualidade dos recursos humanos que devemos apostar para alcançar o sucesso pretendido.
MS- A nível nacional, o futebol feminino está a crescer cada vez mais?
CF- Obviamente que sim. Há uma clara aposta da FPF nesse sentido e as Associações Distritais que a acompanham têm enorme sucesso.
Felizmente já na próxima época 2015/16 haverá o Campeonato Nacional de Juniores, permitindo às nossas atletas usufruir de um quadro competitivo anual regular, situação a que estavam privadas pois no nosso distrito não existe qualquer competição.
Infelizmente a Liga Feminina ainda não arranca este ano, por lamentáveis questões burocráticas ou caprichos clubísticos, focados apenas em interesses próprios, incapazes de ter uma visão mais ampla sobre o desenvolvimento do futebol feminino em Portugal. Certamente que na época 2016/17, com a entrada de clubes como Sporting, Porto, Benfica e outros clubes de referência no panorama do futebol português, a dimensão do futebol feminino será mais visível.
MS- O futuro do Seia FC poderá passar pelo futebol Sénior ou manter esta estrutura atual?
O futuro imediato do Seia Futebol Clube passará pela nova Direção que será eleita na próxima assembleia geral. No entanto, posso adiantar que a estrutura atual é fruto da necessidade e não uma opção!
Considero que um clube sem representação sénior, será sempre um clube diminuído na sua visibilidade. Mas não só. No caso do Seia Futebol Clube, também na sua própria génese formativa.
Não faz muito sentido, travar o processo de formação efetuada aos atletas. O lógico será dar sequência a esse meritório trabalho. No entanto, ainda que sem qualquer custo remuneratório a treinador e jogadores, o Seia Futebol Clube não tem capacidade financeira para suportar o escalão júnior e sénior.
A verdade é que todos têm a mesma retórica de que não pagam aos jogadores, nem treinadores, nem prémios, etc… Mas enfim…
Que lhe poderei dizer?
Nós vimo-nos confrontados com as despesas inerentes à participação destes escalões e percebemos que para tal ser possível teríamos que abdicar de escalões de formação mais jovem. Como é sabido, a génese do Seia Futebol Clube está no contributo à formação integral dos seus atletas, assim sendo tivemos que optar por terminar com os escalões mais elevados.
Propusemos em conjunto com outros clubes uma reestruturação dos nossos quadros competitivos, mas ainda que votada e aceite por maioria em assembleia geral, o facto é que não se concretizou, nem se concretizará essa ou outra qualquer modificação, porque pelos vistos as coisas devem estar bem aos olhos de quem comanda o futebol no nosso distrito. O facto de divergirmos em opinião não significa que ambos não queiramos o desenvolvimento do nosso futebol. Com toda a certeza que sim, cada um á sua maneira e nestas coisas manda quem pode e obedece quem deve.
Para o Seia Futebol Clube, enquanto financeiramente não seja possível, entendo que o clube não deverá participar no escalão sénior, continuando até lá a enveredar todos os esforços possíveis para que essa possibilidade se torne real.
Espero sinceramente que este clube se mantenha fiel à sua génese, sem ceder às tentações nem tomar decisões impulsivas, porque é isso que o diferencia.
Aproveito a oportunidade para desejar as maiores felicidades à direção vindoura, repleta de elementos Orgulhosamente Senenses, na certeza do alcance de todos os sucessos que a atual Direção não conseguiu alcançar.

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