quarta-feira, 23 de novembro de 2022

Artigo de Luís Condeço— Chapéus há muitos!



Chapéus há muitos!



Autor

Luís Miguel Condeço

Docente da Escola Superior de Saúde da Guarda




Todas as crianças, em particular as crianças portadoras de doenças crónicas complexas, limitantes ou ameaçadoras da vida, e suas famílias, devem ter fácil e rápido acesso a Cuidados Paliativos Pediátricos (CPP). Estes cuidados diferenciados devem ir de encontro às suas necessidades, desejos e preferências, em qualquer período da sua vida.

Os princípios orientadores para a prestação de Cuidados Paliativos Pediátricos de qualidade devem ter em conta:a) a definição da Organização Mundial de Saúde (OMS) – intervenção multidisciplinar que melhora a qualidade de vida das crianças e famílias, permitindo enfrentar as dificuldades associadas à doença, através da prevenção e alívio do sofrimento por meio de identificação precoce, avaliação e tratamento de problemas, físicos, psicossociais e espirituais;
b) cuidados centrados na criança-família;
c) prestação dos cuidados no local preferido;
d) prestação baseada nas necessidades (desde o diagnóstico até depois da morte);
e) decisão partilhada entre a criança, família e profissionais;
f) profissionais de saúde pediátricos com formação, treino e experiência;
g) equipas interdisciplinares;
h) serviços de saúde integrados em redes interinstitucionais;
i) a presença de um gestor de caso;
j) o descanso do cuidador;
k) o suporte permanente dos profissionais de saúde à criança e família.

Durante o mês de outubro comemora-se o Dia Internacional para a Consciencialização dos Cuidados Paliativos Pediátricos, sempre na segunda sexta-feira do mês. Esta iniciativa que decorre desde 2016, promovida pela International Children’s Paliative Care Network (Plataforma Internacional de Cuidados Paliativos Pediátricos), tem como objetivo consciencializar toda a sociedade sobre os direitos das crianças com necessidade de intervenção de equipas de cuidados paliativos. Esta ação de sensibilização denominada #HatsOn4CPC (Chapéus para Cuidados Paliativos Pediátricos) procura desafiar todas as pessoas a usar um chapéu nesse dia, sensibilizando todos para os milhões de crianças e jovens com necessidades de cuidados paliativos.

Portugal é segundo a OMS, o país menos desenvolvido da Europa Ocidental na disponibilização de CPP. Apontando-se como fatores predisponentes para a dispersão das crianças e fraca visibilidade destes cuidados nos serviços de saúde: a baixa prevalência; a diversidade de diagnósticos; o estado clínico longo, estacionário e de prognóstico incerto; as diferenças no desenvolvimento de cada criança (físico, fisiológico, cognitivo e emocional); o sofrimento familiar na morte; os dilemas éticos; e o elevado impacto social.

Não podemos também esquecer, o elevado “consumo” de recursos de saúde destas crianças e seus familiares, como os múltiplos episódios de urgência, as dezenas de exames complementares de diagnóstico realizados, os incontáveis internamentos hospitalares, as várias intervenções cirúrgicas e as diversas observações por múltiplas especialidades médicas.

Mas nem tudo fica aquém do esperado, a publicação da Lei n.º 52/2012 de 5 de setembro (Lei de Bases dos Cuidados Paliativos) vem consagrar e regulamentar o direito dos cidadãos aos cuidados paliativos e define a responsabilidade do Estado em matéria de cuidados paliativos, criando a Rede Nacional de Cuidados Paliativos.

A perceção de que os CPP são exclusivos do fim de vida, a busca incessante por uma cura, a má coordenação e comunicação, a falta de informação, treino e recursos, são as principais barreiras à prestação destes cuidados.

É uma responsabilidade de todos nós, divulgar e promover o reforço do papel dos cuidados paliativos, em particular os Pediátricos, como recomenda a OMS, na prestação global de cuidados de saúde ao longo da vida.

Coloquemos um chapéu por esta causa, em outubro e ao longo do ano. Chapéus há muitos (como diria Vasco Santana), mas a necessidade de intervenção paliativa pediátrica é real e urgente. Ousemos todos colocar este chapéu.


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