Pensador e académico com vasta obra publicada, D. José Policarpo
morreu esta quarta-feira aos 78 anos. Foi Cardeal Patriarca de Lisboa
durante 15 anos.
O Patriarca D. Manuel Clemente diz que
“mantém-se viva a feliz memória do seu trabalho e do muito que a Igreja
de Lisboa e a Igreja em Portugal deve à sua generosidade e à sua
lucidez, à sua grande bondade com que exerceu o seu Ministério.
As
exéquias serão na próxima sexta-feira pelas 16 horas na Sé de Lisboa,
seguindo depois para São Vicente de Fora, o panteão dos Patriarcas.
O sonho de ser o Padre da aldeia
D. José Policarpo cresceu no seio de uma família numerosa, com oito irmãos, e descobriu a vocação no dia em que foi crismado.
“A recordação mais antiga que tenho do desejo de ir para o seminário é
o do dia do meu Crisma”, recordava D. José Policarpo numa entrevista
concedida ao jornal “Voz da Verdade”, em Outubro de 2011.
Tinha como sonho ser o Padre da aldeia, mas a Igreja chamou-o sempre para outras funções.
Foi nomeado bispo auxiliar de Lisboa a 26 de Maio de 1978, recebeu a
Ordenação Episcopal a 29 de Junho do mesmo ano e, em Março de 1997,
tornou-se arcebispo coadjutor do Patriarca de Lisboa, D. António
Ribeiro, a quem sucedeu como Patriarca a 24 de Março de 1998.
Natural da pequena aldeia do Pego, na freguesia de Alvorninha,
concelho das Caldas da Rainha, Policarpo cresceu no seio de “uma família
cristã muito piedosa”, como o próprio refere, e acabaria por entrar
para o seminário de Santarém.
Passou, depois, pelo seminário de Almada, um tempo que recorda com
saudade e boa disposição: “Tive dois cargos no seminário de Almada. Um
deles era ser o encarregado da loja onde a rapaziada comprava as coisas.
Depois, fui encarregado do laboratório. Tinha a chave e ia para o
laboratório sempre que quisesse! Uma vez, ia lá ficando, porque me pus a
fazer uma experiência por minha conta e risco e apanhei um choque
enorme”.
Formou-se em Filosofia e Teologia, no seminário maior do Cristo-Rei,
dos Olivais, e passou por Roma e pela Pontifícia Universidade
Gregoriana, antes de regressar a Portugal, para ocupar vários cargos na
Universidade Católica, desde docente a director da Faculdade de Teologia
e, até, a reitor da Universidade, tendo deixado o cargo em 1996.
"Temos de corrigir a rota" Enquanto Patriarca de
Lisboa, D. José Policarpo nunca deixou de ter um olhar crítico para com
o país e a sociedade que o rodeava.
“Estamos num tempo em que isto já não vai lá com lutas sectoriais e
soluções parciais”, afirmou em Dezembro de 2009. “Estamos num tempo em
que o grande desafio é de correcção de rota em termos de civilização”,
acrescentou.
A preocupação com as famílias e a justiça social também foi sempre
uma constante. Na abertura de uma conferência episcopal em Fátima, em
2011, afirmou: “A solidariedade exige a equidade dos sacrifícios que se
pedem, dos contributos que se esperam de cada pessoa ou de cada grupo
social”.
Os problemas que a própria Igreja atravessou nos últimos anos, como
os casos de pedofilia, também não foram indiferentes ao seu discurso e
foram abordados com frontalidade.
Durante o seu mandato, a sociedade portuguesa passou por profundas
transformações e, por várias ocasiões, Igreja e Patriarca opuseram-se às
decisões políticas. São exemplos a liberalização do aborto e aprovação
do casamento homossexual.
Momentos polémicos Foram vários os momentos
polémicos de D. José Policarpo. Uma das suas declarações irritou, em
particular, a comunidade muçulmana.
“Cautela com os amores. Pensem duas vezes antes de casar com um
muçulmano. Pensem muito seriamente. É meter-se num monte de sarilhos que
nem Alá sabe onde é que acabam”, afirmou em Janeiro de 2009, num debate
ocorrido na Figueira da Foz.
Em Outubro de 2012, em pleno clima de contestação social no país,
criticou os protestos, afirmando que não se resolve nada protestando nas
ruas. “Estes problemas foram criados ao longo e muito tempo, por nós e
por quem nos governou”, defendeu.
Dois Papas em 15 anos Enquanto
Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo recebeu duas visitas papais.
João Paulo II veio a Portugal no ano 2000 e, dez anos depois, foi a vez
de Bento XVI.
Enquanto cardeal participou no conclave que elegeu Bento XVI, em
2005, e, em 2013, na eleição do Papa Francisco, que tinha sido feito
cardeal por João Paulo II no mesmo consistório que D. José Policarpo (a
21 de Janeiro de 2001).
Durante o seu mandato, Lisboa acolheu também, em 2005, o Congresso
Internacional para a Nova Evangelização, que levou milhares de pessoas
às ruas da cidade. Uma oportunidade para debater os novos desafios
lançados à Igreja, mas também o que é necessário mudar para que se
adapte aos tempos actuais.
A vontade de estar perto das pessoas levou o Patriarcado de Lisboa a
abrir-se às novas tecnologias e, em 2011, foi lançado um novo portal na
Internet.
No mesmo ano, D. José Policarpo assinalou 50 anos de sacerdócio. Uma
das várias iniciativas que marcou a data foi a publicação de um livro
sobre os seus pensamentos. “Atraídos pelo infinito” conta com textos de
D. Manuel Clemente, que agora lhe sucede como Patriarca de Lisboa.
Pedido de resignação Por
essa altura, já o Cardeal Patriarca tinha apresentado a resignação ao
Papa, por ter atingido o limite de idade de 75 anos. Fê-lo oficialmente
numa carta dirigida a Bento XVI a 17 de Fevereiro, mas Bento XVI
pediu-lhe que prolongasse o seu ministério “por mais dois anos”.
D. José Policarpo acabaria assim por ficar até à resignação do
próprio Bento XVI – notícia que, confessou na altura aos microfones da Renascença, também o apanhou de surpresa.
Foi já depois da eleição do Papa Francisco que a sua resignação foi
aceite, a 18 de Maio de 2013. O Papa nomeou para o cargo de patriarca D.
Manuel Clemente, até à data bispo do Porto.
Terminada a missão como Patriarca de Lisboa, fica a memória de um dos
vários convites à acção que fez durante o mandato. “Convido-vos a
todos, a partir do nosso bairro, a sermos verdadeiramente cidadãos
activos deste mundo novo que queremos construir”, afirmou na conferência
“Portugal, o país que queremos ser”, na F
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